Ensaios filosóficos poéticos do Ronald

O mais legal do Ronald Augusto, isso aparece todo dia no trabalho dele, é que ele gosta de falar sobre texto, linguagem, forma. Tá sempre falando de texto, o Ronald. Então eu vim aqui conversar com ele, com vocês, sobre texto, linguagem, literatura.

Nesse livro novo, O regresso pela porta de marfim, a gente encontra a obra do Ronald Augusto em formato diferente. Em geral, ele publica poemas e críticas. Nesse caso, agora, são ensaios filosóficos poéticos. Na ficha catalográfica, o termo é conto, mas eu li assim: ensaios filosóficos poéticos.

Porque são textos com a alma ensaística (a liberdade, a transcendência), o espírito filosófico (o raciocínio, as inquietações) e o corpo da poesia (o gesto, o sabor, o ímpeto, o som). A prosa aqui é só a roupa, o hábito. Tem coisas que tu só diz quando bota um casaco, um capuz, e acho que esse livro tem isso, uma roupagem diferente pro que o Ronald costuma fazer.

O que o Ronald costuma fazer: textos que tu pensa: é denso, é hermético, e não, não é, pelo contrário, tá tudo exposto, aberto, sem segredo ou cadeado. Cabe a nós montar, organizar um sentido, uma direção. Não tem que decifrar nada, temos é que digerir o explícito em implícito, extraindo o suco do nosso próprio fígado. O texto do Ronald acontece contigo, é tu a construí-lo. E de novo. E daqui a cinquenta anos de novo. Literatura que fica é assim, a gente continua fazendo, lendo.

É sobre isso O regresso pela porta de marfim.

Olha só um trecho, uma explicitude num texto que se chama Amigo íntimo de Catulo: “A ausência da coisa demanda uma enfiada de nomes possíveis que lutam entre si na tentativa de substituí-la.”

Por isso o livro, no caso, eu chamo de ensaio filosófico poético. Porque é disso que o ensaio, a filosofia e a poesia se alimentam, dessa busca por palavras que substituem a ausência da coisa, da ideia, da sensação. A busca do escritor, essa pessoa que precisa escrever, é sempre por uma ausência, né. Se tu já sabe o que dizer, se tu tem o que dizer, por que escrever literatura?

Mais além no livro, outro exemplo, num texto que se chama Quase o ouvimos estalar: “a menção passageira e feiticeira de um lugar sem nome nas entranhas dessa região ignota tornou esse mesmo lugar, aos meus olhos, mais hospitaleiro, sem fronteiras intransponíveis.”

Taí de novo o ensaio, esse gênero, taí a filosofia, essa maneira de pensar, e taí a poesia, esse jeito de ver e sentir. Taí o texto sem fronteiras, a hospitalidade de um caminho em que tu pode ir indo, conhecendo, nos desmedidos passos da prosa.

Esse o clima, no livro todo. Baita charla literária.

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